domingo, 29 de maio de 2022

Ler vem de berço

Até bem pouco tempo, os brasileiros compravam ou faziam assinaturas de revistas em um volume considerável. Hoje, a venda de jornais e revistas caíram, de uma forma tão grande, que é difícil encontrar uma banca na maioria das cidades. Isso significa que o brasileiro está lendo cada vez menos.

Dizer que agora a leitura é feita pelo celular é falta de conhecimento da realidade, porque pela internet as pessoas gastam seus tempos conversando ou vendo o que outras pessoas publicaram de seus próprios mundinhos. Na maioria das vezes, apenas fofocas ou informações que nada constroem. Qualquer texto com mais de três linhas não é bem vistos, pois é tachado de “textão”, algo considerável abominável por aqueles que não suportam ler nada que os faça pensar.

Em 2013, escrevi uma crônica baseada em uma pesquisa que fiz em Assis Chateaubriand. Na época, havia ainda uma banca de revistas com inúmeros títulos, diários, mensais e semanais. Constatei que, com as redes sociais aumentando dia a dia, já havia diminuído o número de leitores, mas tinha ainda um número grande de pessoas que compravam publicações com fofocas de artistas ou com forte apelo sexual. Este último vendia muita revista pornográfica. Porém, tive a informação de que havia aumentado o número de leitores de livros. O quadro era até melhor que o resto do país, neste quesito, quando comparei meus números com uma pesquisa do IBOPE.

Vou iniciar uma nova pesquisa para saber como estão esses números hoje, 2022.

Segundo a Editora Terra, o hábito da leitura começa antes de nascer. A escritora Alessanda Roscoe defende o Aletramento Fraterno que consiste em ler para os filhos ainda durante a gravidez. O nome tem uma razão de ser: estimular o hábito da leitura em uma criança é uma tarefa que pode envolver toda a família", diz essa autora que já escreveu 17 livros. O mesmo estudo mostrou que 85% dos brasileiros prefere assistir televisão a ler qualquer tipo de leitura. Isso foi em 2013. Hoje, a atenção das pessoas é voltada para aquilo que a internet proporciona com foco nas redes sociais.

Quando o assunto é notícia, a atenção é voltada, pela grande maioria, às notícias policiais. Esse mercado do crime ainda gera muita audiência, pois para a maioria das pessoas chega a ser confortável saber detalhes de desgraças, desde que não seja na sua família.

Ainda em 2013, a revista Veja publicou uma matéria sobre este assunto, onde a supervisora da Fundação Educar DPaschoal, Marina Carvalho, profissional que se dedicava a programas de incentivo à leitura, disse que uma das razões para a queda no hábito de leitura entre o público infanto-juvenil é a falta de estímulos vindos da família. “Se em casa as crianças não encontram pais leitores, reforça-se a ideia de que ler é uma obrigação escolar. Se existe uma queda no número de leitores adultos, isso se reflete no público infantil”, garante Marina.  

Em 2006, o jornal inglês The Economist disse que a "leitura no Brasil é uma vergonha. Muitos brasileiros não sabem ler”. Em 2000, um quarto da população com 15 anos ou mais eram analfabetos funcionais.

Muitos, simplesmente não querem ler. Apenas um adulto alfabetizado em cada três lê livros. O brasileiro médio lê 1,8 livro não-acadêmicos por ano, menos da metade do que se lê nos EUA ou na Europa.

Em uma pesquisa sobre hábitos de leitura, os brasileiros ficaram em 27º lugar em um ranking de 30 países, gastando 5,2 horas por semana com um livro. Os argentinos, vizinhos, ficaram em 18º".

Uma das razões de o brasileiro ler pouco está ligada aos preços dos livros, considerados muito caros. Nos últimos 18 anos, a venda de livros encolheu 20%, segundo pesquisa do setor editorial. A culpa é colocada no preço do papel e nos impostos. O preço médio de um livro é de R$ 20, agora em 2022, mas um exemplar de sucesso chega a custar bem mais, como “Inteligência Artificial”, de Russel e Norvig, saindo hoje por 526 reais no Mercado Livre. Para muita gente, é considerado muito dinheiro. Porém, na média, acho que os livros ainda estão baratos, pois, entre 20 e 50 reais pode se comprar um exemplar entre centenas de livros que são sucesso de leitura no mundo todo. O preço não pode ser desculpa para não ler. Além do mais, é possível ler milhares de livros em PDF pelo celular, de graça, sem ter que gastar um tostão. Só não lê quem não quer.

Talvez, a razão maior do hábito de leitura esteja na afirmação da especialista Marina Carvalho, que diz também que crianças precisam estar expostas aos livros antes mesmo de aprender a ler. "Assim, elas criam uma relação afetuosa com as publicações e encontram uma atividade que lhes dá prazer".

Com isso, e por isso, podemos afirmar que ler vem de berço.

Por Clóvis de Almeida - 2013 - 2022

sábado, 28 de maio de 2022

Maioria dos brasileiros não entende o que está escrito

Só 8% dos brasileiros consegue ler e interpretar

Em 2016, uma pesquisa demonstrou que só 8% dos brasileiros consegue ler e interpretar qualquer tipo de texto, por mais complicado que ele seja. Como não tivemos nenhuma evolução significativa na Educação que pudesse mudar esses dados, a coisa deve estar do mesmo jeito, ou pior.

Naquele ano, escrevi e publiquei um artigo sobre o assunto. Nesta semana, ao publicar um anúncio classificado no Facebook, tive a certeza de que muita gente não consegue mesmo entender um pequeno texto de compra e venda, o que dirá uma crônica de uma lauda?

É incrível como há pessoas que confundem as ideias escritas, mesmo quando elas são expostas em apenas duas linhas.

Foi então que me lembrei dessa pesquisa e fui procurá-la.

O número de pessoas que se confundem com os parágrafos é muito grande. Se aplicarmos estes 8% em Assis Chateaubriand, veremos que somente 2.720 pessoas conseguem ler e interpretar textos de variados tipos e estilos! Assim, 31.280 pessoas estariam lendo sem entender o que leram. Seria fantástico se não fosse trágico.

A pesquisa, que ouviu 2002 pessoas, concluiu que na construção civil ou indústria, há somente 3% no melhor nível de alfabetização. No comércio, são 10% das pessoas e na área de saúde, apenas 11%.

É assustador!

Um dos textos muito utilizados em aulas de interpretação de textos e concursos é este: “As meditações traçam num presente eterno a trajetória de um pensamento que decidiu apoiar-se apenas em si mesmo, contando apenas com suas próprias forças para ter acesso à verdade”.

Para a maioria das pessoas, o parágrafo é muito complicado e de difícil entendimento. Oito por cento entende na primeira vez que lê, enquanto apenas 10% entendem ao ler na segunda vez. Mas, 40% só entendem quando há outro texto explicando, enquanto 51% consegue entender com explicação falada. Porém, 49% não entendem nem se desenhar.

No caso do texto acima, a interpretação mais simples seria: “Pensar nos faz o tempo todo viver uma realidade com bases em conhecimentos nossos, tendo somente nossa vontade e conhecimentos para conhecer ao que é certo ou errado”. Ocorre que esta interpretação também é difícil de ser entendida pela mesma maioria. O problema não está nas palavras, mas de como elas são juntadas. Um exemplo clássico é a famosa frase do pensador e economista inglês Ernst Friedrich Schumacher: “Qualquer idiota pode fazer coisas cada vez mais complexas. É preciso um toque de gênio e muita coragem para se mover na direção oposta”. Com certeza você entendeu lendo apenas uma vez. Caso não tenha entendido, está fora do grupo dos 8%.

É triste saber que essa realidade vai de mal a pior, já que, se as pessoas não liam para treinar a interpretação dos textos, agora com o celular é que não vão ler mesmo. Não se pode escrever mais do que duas linhas nas redes sociais que lá vem alguém dizendo “olha o textão!”.

Num mundo em que a comunicação se limita a apenas um punhado de palavras comuns, e diminuindo cada vez mais com o pouco uso ou abreviaturas, ficará cada vez mais difícil para as pessoas usarem as técnicas de interpretação de texto. Alguém pode dizer que não faz diferença, desde que consigam se comunicar. É a recorrência à famosa, ingênua, simplória e burra frase: “o importante é se fazer entender”. Pode até ser, mas isso só vale para o mundinho da vida dentro das redes sociais, do “tipo” homo habilis dos tempos modernos. Aqui fora o bicho pega, pois tem gente que não está conseguindo entender os avisos de corte de energia ou de água, nas contas que chegam em casa. A continuar assim, em breve as pessoas estarão apenas balbuciando palavras de uma ou duas sílabas, como na Idade das Cavernas. Uga, uga!

Mas, é triste informar que logo chegará também o tempo em que apenas o primeiro uga será entendido para a maioria. O outro “uga” vai gerar controvérsias, com uma infindável lista de contestações de gente que se acha letrada, quando não consegue saber o que há em comum entre um ignorante e um patego.

 

*Pesquisa: IPM (Instituto Paulo Montenegro) e pela ONG Ação Educativa. No conjunto, foram entrevistadas 2002 pessoas entre 15 e 64 anos de idade, residentes em zonas urbanas e rurais de todas as regiões do país.