Vejo como meus netos usam o tempo hoje e tento me imaginar criança como eles em meio a tanta tecnologia que não havia há 50 anos. Eles se levantam ligados na internet. Enquanto um busca o telefone celular da mãe, o outro corre ligar a televisão no Youtube ou Netflix, quando não o vídeo game. Ambos vão atrás de jogos em desenhos animados, onde a violência é o prato principal. Já percebi que personagens cortando a garganta de outro, banhados em sangue, são os preferidos. Têem brinquedos aos montes, mas só os usam quando chegam novos, embrulhados em presentes. Uma novidade que não dura meia hora e já vai para a caixa onde guardam o que já não chama mais a atenção.
E assim vai até na
hora de tomar banho para irem à escola. Na volta, tudo se repete: celular ou
televisão, ou seja, telas até na hora de dormir, ato que só fazem depois de a
mãe perder a paciência e ameaçar com chineladas.
Adoram vir à minha
casa, mas sei que é não por minha causa, mas porque os deixo mais à vontade com
o controle remoto da tv, ou no computador para assistirem a seus programas
preferidos.
Eles não fazem a
menor ideia do mundo que vivi, quando criança como eles, aos seis e nove anos
de idade.
Lá pelos anos de 1967,
até 1972, eu e os meninos da época nos divertíamos com brinquedos que as
crianças de hoje nem olhariam. Eu me levantava bem cedo, antes de nascer o sol.
Minha mãe já havia feito o café, que me dava junto com uma fatia enorme de pão.
Nos dias frios, me sentava na saia fogão à lenha para esperar a hora de ir pra
escola.
Voltava perto de
meio-dia, varado de fome, pronto pra devorar uma marmitona, que me esperava no
forninho quente. Comia correndo, como se estivesse atrasado pra pegar algum
ônibus. A razão era uma só: brincar. Cada dia um destino diferente.
Era comum percorrer a
mata perto de casa, à procura de arapucas que outros meninos haviam armado para
pegar passarinhos. Algumas estavam desarmadas com infelizes pássaros presos,
traídos por algumas quireras. Era indescritível o prazer de soltá-los, para em
seguida quebrar as armadilhas feitas de ripas ou gravetos de madeira. Bastava
uma pisada bem forte para destruí-las. O som das arapucas se quebrando ainda
estão nos meus ouvidos como um hino à liberdade. Muitas vezes, fui flagrado
pelos donos das armadilhas fazendo tal serviço. Mas nunca me pegaram. A magreza
ajudava na fuga, principalmente ao pular troncos caídos.
Certa vez, numa
dessas carreiras, me esfreguei todo por sobre um desses troncos, que me
obrigara a pular por cima. Escapei, mas quando parei para recuperar o fôlego,
percebi que estava todo lambuzado com a merda que algum desgraçado havia feito
na árvore caída.
Já em casa, levei
umas boas varadas. O mais difícil foi explicar para minha mãe que eu não havia
rolado na bosta por diversão.
Se eu contar essa
história aos meus netos, tenho certeza que eles vão dizer: Que diversão de
merda! Preferimos pular obstáculos no vídeo game.
Pode ser. Mas, mesmo
cagado, eu acho que vivi mais feliz, pois tenho história pra contar, nem que
seja pra mim mesmo.

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