sábado, 5 de março de 2022

Prêmio de puxa-saco é pé no traseiro

Houve tempo, e por muito tempo, em que as empresas mantinham e valorizavam funcionários do tipo “faz tudo”. Era o cara que sabia de tudo um pouco, quebrava uma tomada, ele trocava, quebrava um balcão, ele colava, pagava contas no banco, fazia compras no mercado para a patroa, lavava o carro do patrão, engraxava o sapato dele e, quando sobrava tempo, fazia o serviço para o qual fora realmente contratado, no melhor exemplo do clássico pelego.

Ainda há muitos deles trabalhando por aí, servindo a “patronagem” no jeito moderno dos moldes dos antigos escravos. E fazem tudo sorrindo, pois nas cabeças desses pobres viventes eles são “mais” que empregados, são considerados “quase que da família” e não conseguem perceber que são usados como trapo, pois no dia que não servirem mais para o tal do “pau pra toda obra”, vão ser mandados embora como qualquer outro que não serve mais aos interesses da empresa.

Muitas vezes, já se ouviu que o patrão valoriza mais quem os enfrenta de “mano a mano”, sem medo de olhar nos olhos, exigindo o devido respeito. É uma grande verdade, pois todos os que se dão valor são respeitados. Porém, há quem goste de bajuladores, puxa-sacos, pelegos do dia a dia, daqueles que ao sair dizem ao chefe: se espirrar enquanto eu estiver fora, saúde!

A linhagem dos baba-ovos está acabando aos poucos, com as especializações do trabalhador. Na medida em que ele se prepara para as atividades que desempenha, se desprende do paternalismo que ainda resta. Quanto mais aprende, mais fica independente e também muito mais produtivo, o que é bom para a empresa. Só não atende perfeitamente às exigências daqueles que querem mais que um funcionário, querem um serviçal, sempre pronto a atender uma ligação na madrugada, ou em pleno domingo, sem contar que precisa estar sempre à disposição para levar a madame no mercado ou as crianças do patrão na escola.

Se essas enumeradas não forem as atividades contratadas do empregado, ele está fazendo algo para agradar a chefia, portanto, é pelegagem, puxa-saquismo do mais puro sangue.

Por falar em empregado, está aí uma palavra que muitas empresas evitam usar, no mais puro eufemismo do mundo moderno. Preferem chamar os funcionários de “colaboradores”.

Ora, é preciso analisar a expressão “colaborador” no lugar de palavras como “funcionário” ou “empregado”, porque o termo pode ser utilizado para esconder a assimetria na relação de trabalho. Para existir uma colaboração real, é preciso que haja um equilíbrio de forças, o que não acontece em uma relação entre empresa e trabalhador. O uso de “colaborador” pode ser uma forma de camuflar as tensões nas relações de trabalho. A expressão pode levar o trabalhador a se esquecer de sua condição de submissão, que não deixa de existir mesmo quando uma empresa é mais participativa. Em alguns casos, o termo pode ser manipulado pelas empresas até para suprimir direitos trabalhistas.

Portanto, trabalhar é dar parte de conhecimento em troca de pagamento ajustado previamente. Servir patrões com trabalho não especificado no contrato é servir sanguessugas, com medo de ser mandado embora.

“Como cidade derribada que não tem muros, assim é o homem que não tem domínio próprio”, (Pv 25:28). Todo mundo sabe que, no fim da linha, o prêmio de puxa-saco é pé no traseiro.

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