segunda-feira, 25 de julho de 2022

A leitura que não lemos hoje

O escritor irlandês Oscar Wilde disse que “a diferença entre a literatura e o jornalismo é que o jornalismo é ilegível e a literatura não é lida”. Me ocorreu uma teimosia interna entre os meus dois neurônios que ainda funcionam, que não se chamam Tico e Teco, porque não os batizei ainda. Poderiam ser Tom e Jerry, ou Bonnie e Clyde, conforme a hora e a ingenuidade ou violência das ideias. A discussão entre os dois foi para definir se a frase de Wilde ainda se aplica, uma vez que ele a citou há 150 anos.

Oscar Wilde era um gênio, conseguia ver quilômetros de anos à frente do que vivia, mas acho que ele não previu o advento da internet e nem das redes sociais, onde todo mundo se mete a fazer notícias, alguns dizendo que são jornalistas, quando não sabem a diferença entre o fake e o fato.

Wilde não imaginava que as redes sociais seriam povoadas por chuvaradas de “fontes” que se copiam, como vírus em expansão, fazendo com que o jornalismo se renda com um refém, buscando os holofotes da fama rápida que os cliques proporcionam, sem esmiuçar as informações recebidas para identificar pelo menos um pingo de verdade. Do jeito que vem, vai. Os likes e os compartilhamentos acabam sendo mais importantes do que um mínimo de verdade. É nesse arremedo de notícias que se destacam os chamados “faits divers”, como naquela “matéria” do Dr. Dráuzio Varela, onde ele abraça um estuprador preso, num grande exemplo da notícia grotesca e passageira.

Então, meus neurônio pagãos decidiram que o jornalismo, nos dias de hoje, é legível sim. Porém, sua leitura tem outra dinâmica, exigindo do leitor mais do que saber ler. Mais do que a leitura, ele precisa também ter a capacidade de análise e cruzamento de informações para um mínimo de checagem. Na menor hipótese de não ser verdade o que ele acaba de ler, precisa buscar no Google mais informações. Quase sempre encontra o desmentido, lhe abrindo os olhos para mais um fake news. Quantos fazem isso?

Assim sendo, muito do jornalismo que se faz hoje é legível, só não há garantia de que pode ser chamado de jornalismo.

Quanto à Literatura, Oscar continua sendo Oscar, um exagerado. É que, como dantes, há muitos leitores que primam pela qualidade do que escolhem para ler. Ocorre que esse é time que também gosta de privacidade e não fica publicando aos quatro ventos o que está lendo hoje ou qual livro terá na cabeceira amanhã. É uma questão mais fina, coisa que Wilde não ligava muito, pois o negócio dele era fazer barulho nas multidões. Era mestre em criar frases marcadas por ironia, sarcasmo e cinismo. Em seu romance “Retrato de Dorian Gray”, Oscar fala da arte, da vaidade e das manipulações humanas. Em “O Fantasma de Canterville”, critica o patriotismo da sociedade. Mas escreveu também contos infantis com lições de moral para crianças.
Em maio de 1895, após três julgamentos, foi condenado a dois anos de cadeia, com trabalhos forçados, por "cometer atos imorais com diversos rapazes".

(Clóvis de Almeida – 2010-2022)

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