sábado, 23 de julho de 2022

Os meus tempos dos gibis

As crianças de hoje têm um universo fantástico de informações e passatempo, como, televisão, vídeo game, telefone celular, computadores e processadores digitais de informação com textos, imagens de todos os tipos e sons de primeira qualidade. O mundo dos livros e histórias em quadrinhos é até desconhecido da maioria infantil e juvenil.
Nos anos 60 e 70, a gente mergulhava nos gibis de HQ, onde a diversão, fantasia e cultura se faziam com os personagens Disney, Marvel e muitos outros. Nossos heróis nada tinham a ver com os games barulhentos de hoje, imperava o silêncio dos balõezinhos de vozes, nos textos que davam vida ao Tarzan, Superman, Mickey, Pateta, Bolinha, Tex e muitos outros personagens que povoavam nossa imaginação de meninos e meninas. A gente colecionava uma imensidão de revistinhas coloridas ou em preto e branco, além dos “bolsilivros” de faroeste, guerras e detetives.
Aos domingos, a matinê do Cine Avenida era o palco de uma feira que não se vê mais: a troca de gibis. Com um pacote de revistas debaixo do braço, lá íamos nós fazer a troca com outros colecionadores. Um Tio Patinhas valia dois Pato Donald. Um gibi do Superman valia tanto quanto as 120 páginas do Michey Special. O balcãozinho da bilheteria de ingressos do cinema era disputado para realizar as trocas e, no tempo de figurinhas, servia como mesa para o jogo de abafa, que dizíamos “bafo”. Um punhado de figuras que eram desviradas com uma palmada de mão em concha. Ganhava quem desvirava a maior quantidade delas e a brincadeira acabava quando Dona Maria, ou seo Naboro, os donos do cinema, abriam a pequena janela para a venda de ingressos.
Impossível esquecer aquele cheiro de pipocas e o perfume doce da baleira no hall de entrada. Balas Toffe, Sete Bello e as variedades em hortelã coloriam a vitrine toda de vidro.
Toca uma música na orquestra de Paul Mauriat e abrem-se as cortinas da tela, ao mesmo tempo em que se apagavam as luzes. Ia começar o filme, num silêncio total, mesmo com a sala cheia de espectadores.
Moleque é mesmo coisa impossível. Quando terminava o filme, a gente fingia que estava dormindo na cadeira, para assistir a última sessão da tarde, de graça. Dona Maria fazia a inspeção e passava devagarzinho, como se não quisesse nos acordar, subindo de volta pelo corredor, com passos de quem fingia acreditar na nossa mentirinha. E assim a gente, uns três ou quatro garotos, assistia ao filme seguinte, pensando que havia enganado mais uma vez a japonesa.
Alguns anos mais tarde, o melhor lugar do Cine Avenida era o “inferninho”, elevado ao lado das máquinas de passar filme, com cadeiras reservadas aos namorados. Ali era o verdadeiro escurinho do cinema. Esses reservados ainda existem nos cinemas de hoje, mas não com o glamour daquela época.
Muitas vezes a molecada se sentava no inferninho para jogar balas ou chicletes na cabeça de quem estava embaixo. Alguns adultos também faziam isso.
Quando o filme acabava era hora de ir pra casa ler os gibis que havíamos trocado antes das sessões. A luz da lamparina era testemunha de que só se dormia depois de virar a última página, com a historinha que se entremeava com as imagens do filme de bang-bang que se vira à tarde, no cinema que anos depois virou sapataria.
//// Por Clóvis de Almeida ////
Foto: Baleira do Cine Avenida - Ao centro, dona Maria com os filhos.

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